defasagem: Apesar de iniciativas recentes do governo, número de alunos
em curso médio especializado é bem inferior ao visto em nações
desenvolvidas
A diferença entre o número de brasileiros no ensino superior (6,7 milhões) em relação ao de matriculados em cursos técnicos de nível médio (1,2 milhão) é um "paradoxo com o qual não podemos conviver". Palavras da presidente Dilma Rousseff em abril do ano passado, quando lançou o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). "No mundo inteiro essa relação é absolutamente diferente."
Apesar do crescimento de 60% nos últimos cinco anos, a quantidade de
jovens na educação profissional, proporcionalmente, é inferior não só à
de países desenvolvidos, mas também à de Argentina e Chile, segundo
especialistas. Uma realidade que impõe ao Brasil uma série de desafios
para atender à demanda por mão de obra qualificada de uma economia
emergente.
A necessidade de contratar técnicos se intensificou com a expansão do
Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no
país) e em face das projeções de investimentos do setor privado. Só o
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) prevê que, até 2015,
o país terá de formar 7,2 milhões de trabalhadores em nível técnico e
áreas de média qualificação para atuar em profissões industriais.
Enquanto isso, quase oito milhões de estudantes fazem o ensino médio
tradicional, com as disciplinas teóricas preparatórias para o vestibular
- e distantes da realidade dos jovens e do mercado de trabalho.
Com o Pronatec, o governo quer ampliar a oferta de vagas gratuitas na
rede federal de educação, ciência e tecnologia e no Sistema S, entre
outras ações. Este ano deve ser investido R$ 1,6 bilhão, com o objetivo
de chegar a 1,6 milhão de matrículas no ensino técnico, sobretudo nas
modalidades concomitante e subsequente.
- Não temos um apagão de mão de obra, mas é imperativo formar
profissionais para setores que visam a ter ganho de produtividade, como a
indústria, e de uso intensivo de trabalhadores, caso da construção
civil - diz o secretário de Educação Profissional e Tecnológica do
Ministério da Educação, Marco Antonio de Oliveira, responsável pelo
Pronatec.
cultura do "bacharelismo"
Para o diretor de Educação e Tecnologia da Confederação Nacional da
Indústria (CNI), Rafael Lucchesi, a lógica educacional do país deve
tirar o foco do "bacharelismo":
- Pela lógica do sistema, parece que todos os alunos vão para a
universidade, mas pouco mais de 14% dos brasileiros de 18 a 24 anos
frequentam o ensino superior. Muitos saem da escola sem uma bússola para
o mercado de trabalho.
Inspirado no pai, Jofre Bezerra Felix, de 23 anos, deu uma guinada na
vida profissional após fazer um curso no Senai. Começou cedo, no
primeiro ano do ensino médio, como aprendiz de mecânico. Especializou-se
em ferramentaria de moldes para plásticos e, depois, fez curso técnico
em mecatrônica, no Senai do Brás, Zona Leste de São Paulo.
- Minha ideia era fazer faculdade, mas as empresas me diziam que quem
era da área operacional e só tinha curso superior demorava mais para
chegar aos cargos mais altos - afirma Jofre. - Fiz o técnico para
acelerar minha ascensão na carreira e chegar mais perto dos níveis
gerenciais.
Já trabalhando, entrou em engenharia mecânica na Universidade São
Judas. Preparou-se para a Olimpíada do Conhecimento do Senai - e venceu.
Jofre está no segundo ano da graduação e é instrutor no curso técnico
em mecânica no Senai em Santo Amaro, Zona Sul. Quer fazer pós-graduação e
montar uma empresa:
- A formação técnica me deu uma profissão e um norte na vida.
Para a professora da Faculdade de Educação da USP Carmen Vidigal
Moraes, pesquisadora de políticas públicas para o ensino profissional, a
expansão das matrículas no ensino técnico deveria dar prioridade à
modalidade integrada:
- Precisamos de mais escolas em período integral e professores bem remunerados.
Mas Carmen critica o discurso "pragmático" e "reducionista" que vincula a educação às necessidades do mercado:
- A educação é um direito inalienável de inclusão cidadã que tem objetivos mais amplos - afirma Carmen.
A Lei das Cotas, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em agosto,
também vale para as 38 instituições federais de ensino técnico de nível
médio. As escolas deverão reservar, no próximo processo seletivo, pelo
menos 12,5% das vagas para alunos que tenham cursado integralmente o
ensino fundamental na rede pública, chegando a 50% dentro de quatro
anos.
Metade deverá ser para estudantes com renda familiar bruta igual ou
inferior a 1,5 salário mínimo per capita (R$ 933). A outra parte será
destinada à soma de negros, pardos e indígenas na população de cada
unidade da Federação.
Fonte:Autor(es): Carlos Lordelo. O Globo
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