Já
é problema antigo do setor da confecção nacional - criar um padrão de
tabela de medidas que deva ser seguido por todas as empresas de moda do
país, afim de facilitar para o consumidor encontrar a peça do seu
tamanho. Dada a diversidade do corpo do brasileiro, muitos desafios
ainda estão por vir nessa padronização.
O Senai Cetiqt está realizando um estudo antropométrico da população brasileira,
que deve ser concluído até meados de 2014. A ABNT já havia criado uma
tabela para o público infantil e masculino, mas que não era
majoritariamente seguida pelas empresas e, até o final deste ano,
pretende terminar sua tabela padronizada para o feminino. Mas
por enquanto nada foi definido, o que leva cada empresa a usar as
tabelas que preferir, muitas vezes baseadas em medidas internacionais,
que não servem para a nossa população.
A discussão foi também tema de documentário, Fora de Figurino - As medidas do jeitinho brasileiro, de Paulo Pélico.
Conversamos com Sheila Gies,
que é MSc em Desenvolvimento de Produto de Vestuário e Ph.D. em Design
de Moda e Cultura Material, ambos pela Manchester Metropolitan
University, Reino Unido, e professora associada à WelfenAkademie Braunschweig, Alemanha, sobre os desafios para se definir essa tabela.
Blog Tendere: Por que é tão difícil definir um padrão de medidas nacional?
Sheila Gies: Para se ter um padrão confiável de medidas nacional é necessário que se empreenda um processo meticuloso de medição, registro e análise de dimensões específicas do corpo de um número representativo de brasileiros, ou seja, o número de pessoas a serem medidas no processo deve ser considerado estatisticamente em proporção à nossa população total, que está em torno de 200 milhões, e as variáveis de sua concentração em áreas do nosso país, que possui dimensões continentais.
Para
se ter uma ideia, no Reino Unido, o pioneiro a empreender esse tipo de
pesquisa com escaneamento em grande escala, em 2001, teve uma amostragem
de 11 mil voluntários (da qual fiz parte), para uma população de
aproximadamente 58 milhões Se considerarmos para o Brasil os mesmos
critérios usados no Reino Unido, podemos esperar uma amostragem de pelo
menos 38 mil voluntários. Esse
número, muito alto, pode ser comprometido por recursos operacionais
financeiros ou mesmo técnico-científicos, já que as distâncias entre os
locais onde a pesquisa é feita é ainda maior no Brasil.
Supondo
que a amostragem seja representativa, definir um padrão implica em
estabelecer uma uniformidade de acordo com critérios pré-estabelecidos.
Estabelecer tais critérios é uma das facetas mais importantes, pois
a variação física nacional é extensa, a distribuição das dimensões do
corpo é bem particular. Temos estereótipos mas não um padrão físico
real reconhecidamente nacional. Além disso, padrões não são definitivos,
podem mudar com o passar do tempo, de acordo com a nutrição ou estilo
de vida, entre outros, e necessitam de atualização.
A distribuição geográfica da população no Brasil também pode
dificultar, por ser complexa e não é estática. Além de aspectos
diferenciais entre regiões que colaboram para as dimensões do corpo como
clima, composição étnica predominante na miscigenação estilo de
vida, alimentação ou renda per capta, não se pode esquecer o fluxo
migratório entre as regiões Embora o processo seja complexo, tais
dificuldades não devem impedir que o empreendimento seja feito,
porque são estas também as principais características que demandam o
levantamento antropométrico.
BT: Quais os principais fatores na hora de se pensar um padrão de medidas para o brasileiro?
SG:
O escaneamento é feito em duas instâncias: de pé e sentado. Quando
pensamos em escaneamento, pensamos em números que as medidas
digitalizadas irão revelar. Medidas manuais também são tomadas, para
incluir medidas não abrangidas pelo processo de digitalização No caso
do Reino Unido foram 130 medidas digitalizadas e 8-10 manuais (por ex.
altura e peso, circunferência na cintura, quadril e tórax).
Além
destes dados devem-se incluir informações qualitativas fundamentais e
pertinentes a todo processo de levantamento antropométrico, como idade,
gênero, região ou cidade onde a medição foi feita, tamanho percebido,
dados pessoais, questões de vestuário, hábitos de compra e preferências,
estilo de vida, incluindo saúde e prática de esportes, ocupação e
emprego, grupo sócio-econômico. No Reino Unido incluiu-se o item
“etnia”, que não considero pertinente no nosso caso porque
a miscigenação é uma das nossas principais características.
Tendo
a parte do processo de medição e registro das informações completos,
vem a fase da análise de tais informações Essa sim é fundamental
porque, baseada nos dados, estabelecerá quais os dados que apresentam
similaridade suficiente para serem definidos como grupo. É provável que
os dados revelem dimensões bem particulares, porque nossa miscigenação é
única. Pode ser que tenhamos de definir tamanhos pequeno/curto,
pequeno/médio e pequeno/longo, o mesmo acontecendo com o tamanho médio e
grande, o que já existe em outros países, mas é bem provável que com
dimensões diferentes do que teremos em nosso país.
É
uma pesquisa muito interessante e importante em vários aspectos.
Conhecendo melhor nossos biotipos, no plural, certamente tornará o
processo produtivo mais econômico e sustentável, com menos sobras
para liquidação além de melhorar a qualidade do caimento, conforto,
aparência e facilitar a identificação do tamanho na hora da compra,
fundamental em tempos de comércio virtual.
Vivian Berto
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