No Brasil já são produzidas mais de 900 milhões de peças de vestuário infantil por ano, o que representa 20% do setor têxtil segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). E quem escolhe essas roupas não são mais apenas os pais. Pelos dados da associação, cerca de 80% das 38 milhões de crianças brasileiras palpitam sobre o que querem (ou não) vestir. Nesse universo, novas marcas entram no mercado e as tradicionais, para adultos, se desdobram em coleções infantis. A semana de moda específica também ganha corpo: a Fashion Weekend Kids, que vai de 20 a 22 e de 27 a 29 de agosto, em São Paulo, chega a sua 11ª edição e passa a ter seis dias de desfile, dois a mais que no evento anterior.
Um dos pioneiros desse processo no Brasil é Ronaldo Fraga, que há dez anos criou a marca Ronaldo Fraga Para Filhotes. Hoje, ela já representa a 50% da produção, o que motivou o estilista a ter uma fábrica específica em Belo Horizonte. A expansão, daqui para frente, se dará pela marca Para Filhotes - assim mesmo, sem seu nome no futuro - e sua linha original terá um posicionamento cada vez mais exclusivo.
A empreitada já rendeu ao estilista frutos em outros segmentos. Ele criou neste ano uma coleção de sapatinhos para a marca Bibi - parceria que será repetida no fim do ano - e lança em agosto uma linha de cama, mesa (incluindo louça) e banho em parceria com a Tok&Stok.
Fraga tem dois filhos, Ludovico, de oito anos, e Graciliano, de sete. A família acaba de voltar da Itália, onde passou um mês viajando atrás de uma companhia de circo - experiência que no futuro pode inspirar uma de suas coleções. Ele não tem televisão em casa. O computador fica na confecção, bem longe das crianças, que ficam também em Belo Horizonte durante os desfiles da São Paulo Fashion Week. "Não quero que eles pensem que meu ofício é só esse glamour". O objetivo de tudo isso é tentar aproximar as crianças de outros hábitos, como o da leitura, de desenhar e brincar.
Em entrevista ao Valor, Fraga foi categórico ao dizer que as crianças não devem ser estimuladas por grifes e que a identidade dos pequenos não é preservada quando se vestem como os adultos.
Valor: Qual o desempenho da Ronaldo Fraga Para Filhotes?
Ronaldo Fraga: O infantil representa 50% do volume da minha produção e está em 170 multimarcas. Montei uma fábrica em Belo Horizonte só para atender os pequenos. A ideia é deixar a linha adulta cada vez mais exclusiva, em poucos pontos de venda, e avançar com o infantil, pois com ele existe um universo de lojas que é mais seguro. O adulto demanda mais cuidado na distribuição. Cada vez mais a marca infantil caminha para ser independente. Quero, aos poucos, tirar meu nome e deixá-la só como "Para Filhotes".
Valor: O que o inspirou a começar esse projeto?
Fraga: Quando meu filho Ludovico estava para nascer procurei roupas para ele e não gostava de nada. Como estava num espaço entre uma coleção e outra acabei desenhando e fazendo as roupas dele. Gostei da liberdade de criar para crianças.
Valor: Como o sr. avalia a moda infantil de dez anos atrás, quando começou?
Fraga: Naquela época nenhuma marca pensava, por exemplo, em aproximar as roupas da cultura brasileira. Tudo era muito previsível. Havia roupinhas cor-de-rosa para meninas, azul para os meninos. As roupas de festa eram armadas, grandes, não eram para correr, brincar. A moda não era entendida como educação. Isso não existia.
Valor: E qual a importância da moda na formação dos pequenos?
Fraga: A roupa é importante no momento em que ela deixa de ser apenas roupa. Ela pode e deve ter uma história, ter um ingrediente que permita aos pais ter alguma interação com a criança.
Valor: Como os pais podem fazer isso?
Fraga: Buscando nas roupas ingredientes que façam com que as crianças aprendam sobre outras coisas. Eu fiz estampas de mula- sem-cabeça, bolacha Maria substituindo o nome da marca por outros que caíram em desuso. Com isso, a criança começa a conhecer a cultura brasileira, o folclore. É preciso estimular o caráter lúdico de se vestir. Tenho a preocupação de não só fazer roupa, mas gerar uma discussão em torno dela.
Valor: O que mais o incomoda na moda infantil atual?
Fraga: É a erotização. A mãe que veste a criança de forma antiga, antiquada, ou coloca meninas como minipersonagens de novela. Acho que a criança tem de se vestir como criança. É absurdo, por exemplo, que elas usem sapatos com saltos. No Brasil, as crianças têm muita influência da TV.
Valor: Como outros países veem isso?
Fraga: Na Europa a mídia é mais controlada, há mais cuidado com as normas. Com isso, os meninos sofrem menos influência do universo dos adultos e são crianças até mais tarde. Nos Estados Unidos é como aqui, quase tudo liberado. A puberdade chega cedo, com oito ou nove anos as crianças já se vestem como adultas.
Valor: E o sr. escolheu nadar contra essa corrente.
Fraga: Apostei em um caminho que poderia ser classificado como pouco comercial. Após dez anos percebo que os problemas que eu via no início eram só a ponta do iceberg. A verdade é que sugestionaram a individualidade das crianças vestindo-as como o pai ou a mãe. É preciso ter cuidado para não acelerar processos, entender a moda como parte importante na formação cultural. É preciso cultivar a identidade dos pequenos. A influência dos pais e mães já é naturalmente muito grande. Vestir o filho como o pai é coisa da era vitoriana. Os tempos mudaram, as crianças precisam poder escolher.
Valor: As crianças devem escolher o que vestem?
Fraga: Hoje em dia elas têm mais opinião e isso deve ser considerado. Mas esse fato tem um lado positivo e outro negativo. Por um lado, é sinal de tempos mais permissivos, em que os pais cedem por falta de tempo para ficar com os filhos. Mas isso acontece com roupas, brinquedos... Por outro, é saudável ter opinião. Mas quem manda precisa ser sempre o pai e a mãe. A escolha da roupa deve ser como a da comida. É preciso convencer os filhos a não se empanturrarem de batatas fritas. Com a roupa é igual, eles devem ser levados a escolher uma e não outra.
Valor: Mas as grifes já têm um peso na escolha das roupas.
Fraga: Tenho horror a crianças estimuladas por milhões de grifes. E isso acontece porque as mães levam os filhos para passear no shopping, que é um lugar cômodo para a família. Não é fácil fazer concessões.
Fonte:valoronline
Um dos pioneiros desse processo no Brasil é Ronaldo Fraga, que há dez anos criou a marca Ronaldo Fraga Para Filhotes. Hoje, ela já representa a 50% da produção, o que motivou o estilista a ter uma fábrica específica em Belo Horizonte. A expansão, daqui para frente, se dará pela marca Para Filhotes - assim mesmo, sem seu nome no futuro - e sua linha original terá um posicionamento cada vez mais exclusivo.
A empreitada já rendeu ao estilista frutos em outros segmentos. Ele criou neste ano uma coleção de sapatinhos para a marca Bibi - parceria que será repetida no fim do ano - e lança em agosto uma linha de cama, mesa (incluindo louça) e banho em parceria com a Tok&Stok.
Fraga tem dois filhos, Ludovico, de oito anos, e Graciliano, de sete. A família acaba de voltar da Itália, onde passou um mês viajando atrás de uma companhia de circo - experiência que no futuro pode inspirar uma de suas coleções. Ele não tem televisão em casa. O computador fica na confecção, bem longe das crianças, que ficam também em Belo Horizonte durante os desfiles da São Paulo Fashion Week. "Não quero que eles pensem que meu ofício é só esse glamour". O objetivo de tudo isso é tentar aproximar as crianças de outros hábitos, como o da leitura, de desenhar e brincar.
Em entrevista ao Valor, Fraga foi categórico ao dizer que as crianças não devem ser estimuladas por grifes e que a identidade dos pequenos não é preservada quando se vestem como os adultos.
Valor: Qual o desempenho da Ronaldo Fraga Para Filhotes?
Ronaldo Fraga: O infantil representa 50% do volume da minha produção e está em 170 multimarcas. Montei uma fábrica em Belo Horizonte só para atender os pequenos. A ideia é deixar a linha adulta cada vez mais exclusiva, em poucos pontos de venda, e avançar com o infantil, pois com ele existe um universo de lojas que é mais seguro. O adulto demanda mais cuidado na distribuição. Cada vez mais a marca infantil caminha para ser independente. Quero, aos poucos, tirar meu nome e deixá-la só como "Para Filhotes".
Valor: O que o inspirou a começar esse projeto?
Fraga: Quando meu filho Ludovico estava para nascer procurei roupas para ele e não gostava de nada. Como estava num espaço entre uma coleção e outra acabei desenhando e fazendo as roupas dele. Gostei da liberdade de criar para crianças.
Valor: Como o sr. avalia a moda infantil de dez anos atrás, quando começou?
Fraga: Naquela época nenhuma marca pensava, por exemplo, em aproximar as roupas da cultura brasileira. Tudo era muito previsível. Havia roupinhas cor-de-rosa para meninas, azul para os meninos. As roupas de festa eram armadas, grandes, não eram para correr, brincar. A moda não era entendida como educação. Isso não existia.
Valor: E qual a importância da moda na formação dos pequenos?
Fraga: A roupa é importante no momento em que ela deixa de ser apenas roupa. Ela pode e deve ter uma história, ter um ingrediente que permita aos pais ter alguma interação com a criança.
Valor: Como os pais podem fazer isso?
Fraga: Buscando nas roupas ingredientes que façam com que as crianças aprendam sobre outras coisas. Eu fiz estampas de mula- sem-cabeça, bolacha Maria substituindo o nome da marca por outros que caíram em desuso. Com isso, a criança começa a conhecer a cultura brasileira, o folclore. É preciso estimular o caráter lúdico de se vestir. Tenho a preocupação de não só fazer roupa, mas gerar uma discussão em torno dela.
Valor: O que mais o incomoda na moda infantil atual?
Fraga: É a erotização. A mãe que veste a criança de forma antiga, antiquada, ou coloca meninas como minipersonagens de novela. Acho que a criança tem de se vestir como criança. É absurdo, por exemplo, que elas usem sapatos com saltos. No Brasil, as crianças têm muita influência da TV.
Valor: Como outros países veem isso?
Fraga: Na Europa a mídia é mais controlada, há mais cuidado com as normas. Com isso, os meninos sofrem menos influência do universo dos adultos e são crianças até mais tarde. Nos Estados Unidos é como aqui, quase tudo liberado. A puberdade chega cedo, com oito ou nove anos as crianças já se vestem como adultas.
Valor: E o sr. escolheu nadar contra essa corrente.
Fraga: Apostei em um caminho que poderia ser classificado como pouco comercial. Após dez anos percebo que os problemas que eu via no início eram só a ponta do iceberg. A verdade é que sugestionaram a individualidade das crianças vestindo-as como o pai ou a mãe. É preciso ter cuidado para não acelerar processos, entender a moda como parte importante na formação cultural. É preciso cultivar a identidade dos pequenos. A influência dos pais e mães já é naturalmente muito grande. Vestir o filho como o pai é coisa da era vitoriana. Os tempos mudaram, as crianças precisam poder escolher.
Valor: As crianças devem escolher o que vestem?
Fraga: Hoje em dia elas têm mais opinião e isso deve ser considerado. Mas esse fato tem um lado positivo e outro negativo. Por um lado, é sinal de tempos mais permissivos, em que os pais cedem por falta de tempo para ficar com os filhos. Mas isso acontece com roupas, brinquedos... Por outro, é saudável ter opinião. Mas quem manda precisa ser sempre o pai e a mãe. A escolha da roupa deve ser como a da comida. É preciso convencer os filhos a não se empanturrarem de batatas fritas. Com a roupa é igual, eles devem ser levados a escolher uma e não outra.
Valor: Mas as grifes já têm um peso na escolha das roupas.
Fraga: Tenho horror a crianças estimuladas por milhões de grifes. E isso acontece porque as mães levam os filhos para passear no shopping, que é um lugar cômodo para a família. Não é fácil fazer concessões.
Fonte:valoronline
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