Os experimentos de Skinner revolucionaram a Psicologia ao incorporar a estatística ao estudo do comportamento dos animais. Com sua engenhosidade mostrou como o treinamento pode influenciar atitudes. Mas quais seriam as influências disso no mundo corporativo?
No final da década de 1920, a Primeira Guerra Mundial acabara de terminar, deixando um enorme e traumático rastro de destruição, tanto física quanto psicológica. O principal consolo vinha dos divãs onde a psicanálise de Freud era a (única) resposta para tudo.
Mas para o psicólogo americano B. F. Skinner, a grande influência vinha da obra do russo Ivan Pavlov e suas pesquisas com o condicionamento de cães.
Fascinavam-lhe as histórias sobre o como o cientista era capaz de fazer seus cães salivarem ao simples toque de uma sineta. Mas Skinner não via glamour nenhum na saliva do cão. Se a hipótese funcionava para uma glândula, especulava, deveria funcionar também para o organismo todo.
Para ele, tais idéias não poderiam se restringir a simples reflexos. Antes, deveriam se estender ao comportamento. Se Pavlov conseguira condicionar uma resposta involuntária a um estímulo, o mesmo não seria possível com uma resposta voluntária? Daria para condicionar um animal a realizar uma tarefa por meio de uma recompensa?
* * * * * * * * * *
Já estudando em Harvard, Skinner herdou umas cobaias de laboratório de um colega que mudou-se de lá. Nessa época ele começou a construir suas famosas caixas: artefatos mecânicos complexos que o auxiliavam em suas pesquisas, dentro das quais observava as performances de seus camundongos e pombos.
Uma sutil diferença com relação aos estudos do russo está na ordem dos eventos: enquanto que o estímulo (sineta) ocorria antes da resposta (salivação) nos experimentos dos cães de Pavlov, os ratinhos de Skinner recebiam comida depois de realizar uma tarefa.
Ao alimentar as cobaias depois que elas pisavam numa alavanca, por exemplo, Skinner ensinava-as que valia a pena pisar na alavanca. Pisar na alavanca significava ganhar uma recompensa: comida.
Mas Skinner foi além e criou diversas variações para ver até que ponto o comportamento poderia ser aprendido. O ratinho apertava a alavanca uma vez e nada. Duas vezes e nada. Na terceira vinha a comida. Quando quis comer novamente, o ratinho apertou a alavanca três vezes seguidas. Espantoso!
Em seguida Skinner retirou a comida e mediu quanto tempo levava para o ratinho perceber que a farra acabara. Depois a comida voltou, mas agora após sete apertos na alavanca. Depois doze. Vinte. Treze. Milhares de variações, infinitas medições, atitudes rigorosamente cronometradas, mudanças comportamentais criteriosamente observadas.
As engenhosas Caixas de Skinner registravam todos os movimentos de suas cobaias. Um fabuloso volume de dados era gerado a cada nova sessão de experimentos. Em seus trabalhos observou-se, pela primeira vez, o extensivo uso de ferramentas e modelos estatísticos complexos, em vários níveis. Do seu rigor metodológico nasceu a verdadeira Ciência do Comportamento.
* * * * * * * * * *
As variações seguintes foram igualmente reveladoras: as caixas foram programadas para liberar a comida de forma aleatória. Às vezes o ratinho ganhava comida depois de trinta apertos na alavanca. Às vezes saía sem nada. Vinte e três apertos e, oba, comida! Dezoito e nada. Apesar de a intuição sugerir que recompensas aleatórias ou muito espaçadas eliminam o comportamento, não foi o que Skinner observou. Ao contrário, ele percebeu que os hábitos baseados em recompensas irregulares são os mais difíceis de serem quebrados.
Com a ajuda dos ratinhos Skinner explicou porque perdemos fortunas em máquinas caça-níqueis e porque a leitora se apaixona pelo namorado que liga de vez em quando. Ou, usando o jargão habitual, como os reforços/recompensas intermitentes transformam-se em compulsão.
Outro comportamento errático identificado por Skinner foi o que chamou de superstição dos pombos.
Trancada numa gaiola, a ave recebia comida em intervalos de tempo absolutamente aleatórios. Sem saber disso, ela acreditava que alguma atitude sua havia liberado a comida e passava, assim, a repetir aquele gesto específico na esperança que mais comida fosse oferecida.
Isto é, se o pombo girasse o pescoço para a direita no exato momento que a comida aparecesse, ele imaginava que a comida havia aparecido graças a isso e, assim, passava a girar a cabeça para a direita freneticamente. Do mesmo modo que o técnico de futebol não troca de camisa e o jogador de bingo atribui sua sorte ao fato de não trocar de cuecas há três dias. (Percebem como a superstição é uma atitude inteligente?)
* * * * * * * * * *
Enquanto criava variações para seus experimentos, Skinner tornou-se um exímio adestrador de animais. Seu coelho depositava moedas num cofrinho. Seu gato tocava piano e seus pombos dançavam. E se animais com cérebros menores que um amendoim poderiam aprender tarefas compexas, de que seria capaz o homem? Com o treinamento adequado, qualquer um poderia aprender qualquer coisa.
Nas décadas de 1950 e 1960 seus métodos de condicionamento do comportamento foram levados a sanatórios psiquiátricos onde esquizofrênicos irrecuperáveis conseguiam aprender a realizar algumas tarefas quando recompensados. Modernamente, traumas, fobias e outros distúrbios de ansiedade são tratados segundo suas teorias.
* * * * * * * * * *
Outro lado muito explorado na biografia de Skinner refere-se às suas publicações não-científicas. Acreditado que aliando o poder da recompensa e reforço positivo a treinamentos específicos, seria possível condicionar seres humanos padronizando seus comportamentos numa sociedade pasteurizada.
Seu romance Walden Two descreve uma comunidade organizada em torno da engenharia do comportamento, governada não por políticos, mas por psicólogos.
Dentro de um estilo de vida que não apoiasse guerras, competição ou conflitos sociais, as regras defenderiam o consumo mínimo, relações sociais ricas, felicidade pessoal, trabalho estimulante e lazer.
Uma utopia interessante, decerto necessitando algumas correções e semelhante a muitas comunidades já existentes por aí (vide o formidável "A vila" de M. Night Shyamalan). Mas nada mais do que ficção, assim como Admirável Mundo Novo, 1984 ou Laranja Mecânica.
A verdade é que a maior parte daquilo que hoje sabemos a respeito de psicologia e educação - reforço e recompensa - é baseado exatamente nas obras de Skinner. Ele advogava, inclusive, que o aprendizado deve sempre estar ligado às recompensas e não à punição. Segundo ele, a única coisa que se aprende através da punição é a evitar ser punido. Se você leva um tapa por não saber a capital da Turquia, sua motivação será não apanhar, em vez de querer aprender. Ou então revidar.
Assim como a obra de Pavlov, o legado de Skinner parece não nos saltar tanto aos olhos à primeira vista, talvez porque a maioria desses conceitos parecem já vir pregados no nosso cérebro desde que nos entendemos por gente. Mas este parece ser o definitivo reconhecimento da magnitude de sua contribuição, colocando Skinner como um dos grandes cientistas do século XX.
Burrhus Frederic Skinner, o homem que compreendeu os mecanismos do aprendizado humano estudando ratos e pombos, morreu de leucemia em 1990, aos 86 anos.
SKINNER E A ADMINISTRAÇÃO
Três palavras saltam aos olhos neste texto sobre Skinner quando pensamos nas empresas atuais: reforços, recompensas e punições. No moderno jargão corporativo estes termos são substituídos pelo singelo "cenouras e porretes".
Parece justo pensar que recompensas educam muito mais do que punições, mas a razão disso vai um pouco além da base moral desta idéia: uma recompensa motiva muito mais do que (evitar) uma punição.
Além disso, devemos considerar uma diferença fundamental entre nós e roedores e aves: nossas motivações estão um pouco acima da necessidade biológica que o ratinho e a pomba. Claro que comer também é importante para nós, mas levantamos cedo da cama todos os dias para algo além disso.
Recompensas materiais instantâneas estimulam o ratinho a realizar tarefas tão simples quanto apertar uma pequena alavanca - e isto vale também para aquelas tarefas que realizamos no piloto-automático, sem ter que pensar muito.
Mas, como disse no texto anterior, se você quiser uma realização um pouco além disso - um equipe inovadora ou uma solução criativa - terá que oferecer bem mais do que dinheiro. Ou será que Skinner jamais teve um ratinho ninja ou uma pomba endiabrada?
O QUE VEM POR AÍ
Ocorre, ainda, que na maioria das vezes o aprendizado é um processo coletivo e o grupo pode interferir de maneira decisiva na forma como aprendemos e nos comportamos
Fonte:administradores.com.br
No final da década de 1920, a Primeira Guerra Mundial acabara de terminar, deixando um enorme e traumático rastro de destruição, tanto física quanto psicológica. O principal consolo vinha dos divãs onde a psicanálise de Freud era a (única) resposta para tudo.
Mas para o psicólogo americano B. F. Skinner, a grande influência vinha da obra do russo Ivan Pavlov e suas pesquisas com o condicionamento de cães.
Fascinavam-lhe as histórias sobre o como o cientista era capaz de fazer seus cães salivarem ao simples toque de uma sineta. Mas Skinner não via glamour nenhum na saliva do cão. Se a hipótese funcionava para uma glândula, especulava, deveria funcionar também para o organismo todo.
Para ele, tais idéias não poderiam se restringir a simples reflexos. Antes, deveriam se estender ao comportamento. Se Pavlov conseguira condicionar uma resposta involuntária a um estímulo, o mesmo não seria possível com uma resposta voluntária? Daria para condicionar um animal a realizar uma tarefa por meio de uma recompensa?
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Já estudando em Harvard, Skinner herdou umas cobaias de laboratório de um colega que mudou-se de lá. Nessa época ele começou a construir suas famosas caixas: artefatos mecânicos complexos que o auxiliavam em suas pesquisas, dentro das quais observava as performances de seus camundongos e pombos.
Uma sutil diferença com relação aos estudos do russo está na ordem dos eventos: enquanto que o estímulo (sineta) ocorria antes da resposta (salivação) nos experimentos dos cães de Pavlov, os ratinhos de Skinner recebiam comida depois de realizar uma tarefa.
Ao alimentar as cobaias depois que elas pisavam numa alavanca, por exemplo, Skinner ensinava-as que valia a pena pisar na alavanca. Pisar na alavanca significava ganhar uma recompensa: comida.
Mas Skinner foi além e criou diversas variações para ver até que ponto o comportamento poderia ser aprendido. O ratinho apertava a alavanca uma vez e nada. Duas vezes e nada. Na terceira vinha a comida. Quando quis comer novamente, o ratinho apertou a alavanca três vezes seguidas. Espantoso!
Em seguida Skinner retirou a comida e mediu quanto tempo levava para o ratinho perceber que a farra acabara. Depois a comida voltou, mas agora após sete apertos na alavanca. Depois doze. Vinte. Treze. Milhares de variações, infinitas medições, atitudes rigorosamente cronometradas, mudanças comportamentais criteriosamente observadas.
As engenhosas Caixas de Skinner registravam todos os movimentos de suas cobaias. Um fabuloso volume de dados era gerado a cada nova sessão de experimentos. Em seus trabalhos observou-se, pela primeira vez, o extensivo uso de ferramentas e modelos estatísticos complexos, em vários níveis. Do seu rigor metodológico nasceu a verdadeira Ciência do Comportamento.
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As variações seguintes foram igualmente reveladoras: as caixas foram programadas para liberar a comida de forma aleatória. Às vezes o ratinho ganhava comida depois de trinta apertos na alavanca. Às vezes saía sem nada. Vinte e três apertos e, oba, comida! Dezoito e nada. Apesar de a intuição sugerir que recompensas aleatórias ou muito espaçadas eliminam o comportamento, não foi o que Skinner observou. Ao contrário, ele percebeu que os hábitos baseados em recompensas irregulares são os mais difíceis de serem quebrados.
Com a ajuda dos ratinhos Skinner explicou porque perdemos fortunas em máquinas caça-níqueis e porque a leitora se apaixona pelo namorado que liga de vez em quando. Ou, usando o jargão habitual, como os reforços/recompensas intermitentes transformam-se em compulsão.
Outro comportamento errático identificado por Skinner foi o que chamou de superstição dos pombos.
Trancada numa gaiola, a ave recebia comida em intervalos de tempo absolutamente aleatórios. Sem saber disso, ela acreditava que alguma atitude sua havia liberado a comida e passava, assim, a repetir aquele gesto específico na esperança que mais comida fosse oferecida.
Isto é, se o pombo girasse o pescoço para a direita no exato momento que a comida aparecesse, ele imaginava que a comida havia aparecido graças a isso e, assim, passava a girar a cabeça para a direita freneticamente. Do mesmo modo que o técnico de futebol não troca de camisa e o jogador de bingo atribui sua sorte ao fato de não trocar de cuecas há três dias. (Percebem como a superstição é uma atitude inteligente?)
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Enquanto criava variações para seus experimentos, Skinner tornou-se um exímio adestrador de animais. Seu coelho depositava moedas num cofrinho. Seu gato tocava piano e seus pombos dançavam. E se animais com cérebros menores que um amendoim poderiam aprender tarefas compexas, de que seria capaz o homem? Com o treinamento adequado, qualquer um poderia aprender qualquer coisa.
Nas décadas de 1950 e 1960 seus métodos de condicionamento do comportamento foram levados a sanatórios psiquiátricos onde esquizofrênicos irrecuperáveis conseguiam aprender a realizar algumas tarefas quando recompensados. Modernamente, traumas, fobias e outros distúrbios de ansiedade são tratados segundo suas teorias.
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Outro lado muito explorado na biografia de Skinner refere-se às suas publicações não-científicas. Acreditado que aliando o poder da recompensa e reforço positivo a treinamentos específicos, seria possível condicionar seres humanos padronizando seus comportamentos numa sociedade pasteurizada.
Seu romance Walden Two descreve uma comunidade organizada em torno da engenharia do comportamento, governada não por políticos, mas por psicólogos.
Dentro de um estilo de vida que não apoiasse guerras, competição ou conflitos sociais, as regras defenderiam o consumo mínimo, relações sociais ricas, felicidade pessoal, trabalho estimulante e lazer.
Uma utopia interessante, decerto necessitando algumas correções e semelhante a muitas comunidades já existentes por aí (vide o formidável "A vila" de M. Night Shyamalan). Mas nada mais do que ficção, assim como Admirável Mundo Novo, 1984 ou Laranja Mecânica.
A verdade é que a maior parte daquilo que hoje sabemos a respeito de psicologia e educação - reforço e recompensa - é baseado exatamente nas obras de Skinner. Ele advogava, inclusive, que o aprendizado deve sempre estar ligado às recompensas e não à punição. Segundo ele, a única coisa que se aprende através da punição é a evitar ser punido. Se você leva um tapa por não saber a capital da Turquia, sua motivação será não apanhar, em vez de querer aprender. Ou então revidar.
Assim como a obra de Pavlov, o legado de Skinner parece não nos saltar tanto aos olhos à primeira vista, talvez porque a maioria desses conceitos parecem já vir pregados no nosso cérebro desde que nos entendemos por gente. Mas este parece ser o definitivo reconhecimento da magnitude de sua contribuição, colocando Skinner como um dos grandes cientistas do século XX.
Burrhus Frederic Skinner, o homem que compreendeu os mecanismos do aprendizado humano estudando ratos e pombos, morreu de leucemia em 1990, aos 86 anos.
SKINNER E A ADMINISTRAÇÃO
Três palavras saltam aos olhos neste texto sobre Skinner quando pensamos nas empresas atuais: reforços, recompensas e punições. No moderno jargão corporativo estes termos são substituídos pelo singelo "cenouras e porretes".
Parece justo pensar que recompensas educam muito mais do que punições, mas a razão disso vai um pouco além da base moral desta idéia: uma recompensa motiva muito mais do que (evitar) uma punição.
Além disso, devemos considerar uma diferença fundamental entre nós e roedores e aves: nossas motivações estão um pouco acima da necessidade biológica que o ratinho e a pomba. Claro que comer também é importante para nós, mas levantamos cedo da cama todos os dias para algo além disso.
Recompensas materiais instantâneas estimulam o ratinho a realizar tarefas tão simples quanto apertar uma pequena alavanca - e isto vale também para aquelas tarefas que realizamos no piloto-automático, sem ter que pensar muito.
Mas, como disse no texto anterior, se você quiser uma realização um pouco além disso - um equipe inovadora ou uma solução criativa - terá que oferecer bem mais do que dinheiro. Ou será que Skinner jamais teve um ratinho ninja ou uma pomba endiabrada?
O QUE VEM POR AÍ
Ocorre, ainda, que na maioria das vezes o aprendizado é um processo coletivo e o grupo pode interferir de maneira decisiva na forma como aprendemos e nos comportamos
Fonte:administradores.com.br
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